Apesar da mídia internacional retratar o recente acordo de cessar-fogo na Faixa de Gaza selado entre Israel e o Hamas como uma vitória, não há garantias de que a sua implementação traga mudanças positivas para o povo palestino, nem mesmo que ela seja respeitada pelo regime sionista, de acordo com Shajar Goldwaser, membro do coletivo Vozes Judaicas por Libertação (VJL). Para ele, trata-se de uma nova etapa do processo de genocídio em curso.
A Opera Mundi, Goldwaser apontou a “pressão” contra o grupo palestino pelo aceite do acordo, que envolveu a participação dos mediadores do Egito e Catar na articulação do texto, mas que sofreu imposições do regime sionista e dos Estados Unidos.
Este detalhe muito explica a abordagem do presidente norte-americano Donald Trump com o Hamas nos dias que antecederam o fechamento do acordo: o republicano ameaçou o grupo a aceitar a proposta o quanto antes, caso contrário, ameaçando dar carta branca ao primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu para destruir o enclave.
“Não é um acordo, não é uma negociação”, afirma Goldwaser. “O que a gente está vendo aqui é uma nova imposição, é uma nova etapa desse processo de genocídio”, acrescenta, enfatizando que o plano de Trump desconsidera pontos essenciais como o encerramento do genocídio e a garantia da autonomia e soberania para os palestinos que habitam em Gaza.
Outro motivo apontado pelo membro do VJL que não assegura a sustentação do acordo diz respeito a uma correlação de forças discrepante: na hipótese do Hamas discordar com o avanço do acordo, os israelenses teriam o respaldo dos EUA. Caso contrário, se Israel rompesse o compromisso, os palestinos não teriam um apoio garantido de nenhuma superpotência.
“A gente está falando do primeiro-ministro Netanyahu do Estado do Israel que, para além de 75 anos de apartheid, colonização, limpeza étnica e genocídio, para além de dois anos de genocídio ininterrupto, ele, nos últimos anos, boicotou as negociações, se negou a negociar e, quando negociou, assassinou os negociadores palestinos do Hamas. Então, é dessa instituição que a gente se pergunta se é ou não confiável”, aponta.
Além desta, houve duas ocasiões em que um acordo de cessar-fogo foi implementado no território palestino. O primeiro, de caráter temporário, ocorreu em 24 de novembro de 2023 e terminou seis dias depois, em 30 de novembro. Já o segundo, assinado em 15 de janeiro de 2025, diferentemente do anterior, caracterizou-se pela divisão em três etapas que, no fim, levaria ao término dos combates em Gaza. Este acabou sendo violado por Israel em 18 de março, dois meses depois, e Netanyahu falsamente justificou que a “repetida recusa” do Hamas em libertar mais reféns o teria levado a romper a tratativa. Nesse mesmo dia, as forças israelenses assassinaram cerca de 400 palestinos.
Outra tentativa de sabotar as negociações ocorreu em 9 de setembro, quando o governo israelense, sob supervisão do premiê, deu aval aos ataques contra prédios residenciais em Doha, no Catar, no momento em que lideranças do Hamas, responsáveis pelas tratativas, discutiam uma proposta de paz. A ofensiva deixou seis mortos, incluindo o filho do principal negociador do grupo, Khalil al-Hayya, o chefe de gabinete de Hayya, três seguranças e um policial catari.

X/Benjamin Netanyahu
Crise no governo Netanyahu interfere no cessar-fogo?
A ratificação do acordo de cessar-fogo teve um considerável atraso em decorrência das divergências apresentadas pelos membros da coalizão de extrema direita de Netanyahu durante a votação, como é o caso dos ministros das Finanças, Bezalel Smotrich, e da Segurança Nacional, Itamar Ben Gvir.
Ambos se recusaram a votar a favor do tratado, rejeitando, em especial, o tópico que prevê a libertação dos palestinos e dos membros do Hamas. Ben Gvir foi além e chegou a ameaçar diretamente ao premiê que se o Hamas não fosse desmantelado, seu partido Otzma Yehudit abandonaria a coalizão e, assim, “derrubaria o governo”.
“Netanyahu se elegeu em 2022, junto com a maior coalizão de extrema direita, ou a coalizão mais à direita da história, da política israelense. Uma coalizão que conta com ministros de suma importância, que não só são contrários ao estabelecimento de um Estado palestino, mas que pregam a completa destruição, o genocídio abertamente, a limpeza étnica abertamente, não só dos palestinos da Faixa de Gaza, mas da Cisjordânia, inclusive dos palestinos que moram dentro do território israelense e que são cidadãos israelenses”, explica Goldwaser.
É importante lembrar que caso Ben Gvir e Smotrich, de fato, deixassem o atual governo, Netanyahu perderia a maioria parlamentar, pois ficaria com apenas 47 assentos no Parlamento do Knesset, de um total de 120 assentos.
“O fato é de que isso só torna mais frágil a posição de Netanyahu, porque a gente não sabe até que ponto ele vai dar para trás, a gente não sabe até que ponto o governo dele pode rachar, pelo simples fato de uma fração dele não querer ir adiante com esse plano e querer ocupar e, de fato, colonizar a Faixa de Gaza”, disse o membro do coletivo.
O post ‘Cessar-fogo em Gaza não encerra genocídio dos palestinos’, diz ativista do Vozes Judaicas por Libertação apareceu primeiro em Opera Mundi.