De quem foi a ideia de usar a Petrobras para beneficiar o agronegócio, bem no momento em que o STF julga os golpistas que foram incentivados e financiados pelo setor?
Logo agora que o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) e o Ministério Público da Bahia desbaratam uma quadrilha de políticos e fazendeiros que corrompiam trabalhadores terceirizados do Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia pra forçar autorizações de perfuração de poço, para o AGRO lucrar mais usando água de graça?
É nesse momento que o estado brasileiro resolve entregar as Usinas de biodiesel da Petrobras para os agroindustriais, coitados, tão impactados com o tarifaço do trapo do Trump que vão ganhar o restante do mercado de biocombustíveis.
E a proposta desse novo modelo se intensificou com a chegada de Angélica Laureano, nova Diretora de Transição Energética que, ao que tudo indica, perdeu o bonde e chegou de taxi, daqueles bem poluentes, para operacionalizar o sensacional, porque não dá pra entender, nem do ponto de vista social nem econômico, como um projeto de incentivo à agricultura familiar nordestina e de transição energética justa, criado por Lula em 2008 com as usinas de biodiesel da Petrobras, se acabe assim, diante do próprio criador.
E logo agora que a Petrobras Biocombustíveis S.A. – PBIO caminha para o segundo ano consecutivo com lucro, depois do desmonte provocado com Temer, aquele do “tem que manter isso aí”. Curiosamente, a parceira de Temer na época, e concorrente da PBIO, a JBS Biodiesel, foi uma das maiores beneficiadas com o desmonte das usinas. Sua produção de biodiesel saiu de 210 mil m3 em 2017 para 540 mil m3 em 2023.
No momento em que a PBIO começa a lucrar, a Petrobras diz que quer fazer parceria com o AGRO. Mas ela não vai abrir licitação não. Ela já tem uma parceira pra chamar de sua. É a Oleoplan, sua concorrente que lucrou em 2024 R$ 828 milhões vendendo biodiesel.
A Oleoplan foi condenada em 2 ocasiões pela justiça do RS por não cumprir normas de segurança. Segundo o MPT um trabalhador morreu em 2011 por causa disso, e passados 3 anos recebendo autos de infração e respondendo ação judicial, a usina não tinha feito nada para resolver seus problemas de segurança, se recusava a assinar um TAC. Segundo a fiscalização, a Oleoplan descumpria 8 Normas Regulamentadoras. É a esse tipo de parceria que vamos obrigar a Petrobras? A Petrobras tão rigorosa nas questões de segurança vai se queimar fumando esse cigarro? Dentre outras coisas vamos agora fomentar o agrotóxico, como uma visão estratégica? E os boia-frias dos canaviais, terão seus míseros salários pagos com o dinheiro da Petrobras?
Para além das questões de segurança e de imagem, no plano econômico a decisão também é inexplicável.
Veja. Quando Lula criou a Petrobras Biocombustíveis, o plano era produzir biodiesel, a partir dos grãos da agricultura familiar e do óleo usado coletado pelos catadores, e misturar no diesel comum. Em 2022, o percentual do biodiesel no diesel era 10%. Hoje é 15%. É obrigatório. Isso significa que, por um lado, a Petrobras reduz as vendas de diesel para dar lugar ao biodiesel, e por outro, evidencia uma demanda crescente pelo biodiesel no país. Ou seja, a Petrobras tá perdendo 15% de vendas no diesel em nome da transição energética. E veja que a proposta do governo é aumentar o percentual de biodiesel para 20%. A Petrobras vai perder mais 5% de vendas.
Além disso, algumas refinarias da Petrobras já estão fabricando o DIESEL R a 5%, que é fruto da injeção de 5% de óleo vegetal, entregue pelo agro, diretamente no processo de fabricação do diesel mineral. Em outras palavras, o agronegócio já abocanhou 5% do mercado de diesel e, segundo a Petrobras, subirá para 10%. Só que tem outra transação nefasta. Como o DIESEL R não é obrigatório, a agroindústria de óleos está adicionando outros 15% de biodiesel no DIESEL R, ao invés dos 10%, ou seja, o agro fornece 5% de óleo para a fabricação do DIESEL R e quando saí da refinaria esse diesel ganha mais 15% de biodiesel.
Se o DIESEL R fosse obrigatório (tivesse mandato do MME), ele concorreria com o biodiesel, mas não é, o que beneficia duplamente o agronegócio e suas monoculturas de soja.
Isso significa que, se todas as refinarias passarem a produzir DIESEL R a 10%, juntando com os 15% de biodiesel, o agro passará a ter aproximadamente ¼ de todo o mercado de diesel no país.
Aí, qual é o plano da companhia?
Ao invés dela compensar essa perda de vendas aumentando a produção do seu próprio biodiesel, incorporando e ampliando suas usinas pra ganhar esse mercado crescente, não. Ela vai entregar o restante do mercado ao agronegócio! E se a Oleoplan tem interesse é porque o negócio do biodiesel é rentável.
Ou seja: se o plano de Lula era promover a agricultura familiar, reduzir a emissão de gases do efeito estufa com a introdução do biocombustível no diesel e reciclar o óleo vegetal usado com o trabalho dos catadores, agora a Petrobras vai promover a expansão agrícola da monocultura, impactando negativamente na emergência climática. Como é sabido o setor agropecuário é responsável por 76% das emissões de fases do efeito estufa.
Essas ações estão alinhadas com o que a presidente da Petrobras disse recentemente em entrevista, de que vai “fundir o setor petróleo com o agro brasileiro”.
Quem foi que inventou essa matemática? Será que isso é um projeto daquele baiano que gosta de biorrefinaria da Mubadala?
Aliado a outras iniciativas como a privatização das operações das FAFENs e do Polo Bahia Terra, as ações expostas pela companhia na área de transição energética abrem o flanco para que a Petrobras se torne uma empresa de escritório, desvirtuando suas funções constitucionais.
No seu plano estratégico a Petrobras diz que vai investir US$ 600 milhões no setor. Soa estranho que a companhia realize um investimento dessa monta num setor de onde está saindo. Mas o plano de negócios da companhia não se limita a esse desassossego.

Quando a Petrobras diz que vai entrar em determinado setor produtivo espera-se que seja para cumprir sua principal função, que é de intervenção do estado no domínio econômico. Mas faz tempo que ela corre disso, como se evidencia no seu plano estratégico.
Ela diz ai que vai investir US$ 2,2 BI no etanol. O então Diretor de Transição Energética Maurício Tolmasquim chegou a dizer em entrevista que “A ideia é começar grande, não é partir do zero”. Mas em outra entrevista mais recente disse que “Será uma parceria com uma empresa que já tenha uma quantidade de usinas funcionando. A Petrobras será minoritária, para não se tornar uma empresa estatal”.
As dúvidas sobre o que ele está querendo dizer ao descartar a possibilidade do ativo ser uma estatal são muitas. Primeiro porque é um valor considerável, maior que o preço da RLAM. Segundo porque é exatamente sendo uma estatal que ela pode intervir no domínio econômico, mas ao contrário, sendo minoritária, a Petrobras estará submetida aos caprichos dos latifundiários da cana e o dinheiro que a companhia investiu no etanol pode virar açúcar. É isso que é entrar no mercado?
Isso sem falar que, sem poder de mando, a Petrobras participará passivamente de uma das maiores explorações do trabalho no Brasil: a dos cortadores de cana, cujo trabalho análogo ao de escravo, inclusive de crianças, foi tema até do documentário “Quadra Fechada” exibido governo federal. É isso que é “fundir o setor petróleo ao agronegócio”?
Agora veja no quadro acima que a empresa também vai investir no biorrefino, US$ 1,5 bi.
O primeiro pensamento que vem à cabeça, considerando que a Petrobras é uma estatal e a maior empresa do país, é que ela vai construir uma biorrefinaria ou vai adequar uma já existente, das onze refinarias que possui. Mais ou menos. Ainda que esteja adequando em algumas refinarias, ela tá investindo numa refinaria privada, a Riograndense, onde a Petrobras é minoritária! Quem acredita que essa refinaria vai reciclar óleo vegetal dos catadores ou comprar dendê da agricultura familiar, pode esquecer. Os testes foram feitos com matéria prima das carvoarias de eucalipto da Vallourec. Ou seja, os investimentos em transição energética vão fortalecer a indústria do carvão vegetal que, ainda que seja menos poluente que o mineral, gera monóxido de carbono e metano, além de consumir grandes quantidades de água e empobrecer o solo.
Tudo isso ao custo de reduzir o tamanho da Petrobras. No caso dos biocombustíveis, é terceirizar a operação das usinas transferindo compulsoriamente trabalhadores que serão mantidos provisoriamente como cedidos e com futuro incerto, mas mantendo os altos cargos às custas da Petrobras.
Para além disso, a companhia está realizando investimentos nas usinas enquanto avançam as negociações com a Oleoplan, o que pode significar uma benesse desproporcional por parte da Petrobras, assumindo custos de deveriam ser da empresa privada que, em ultima instancia, pode ser vista pelos órgãos de controle como uma transferência indiretamente e indevida de recursos públicos para o agronegócio.
Nem durante o governo Bolsonaro permitiram uma ingerência tão grande do agronegócio no centro de decisão na companhia. Estamos criando reserva de mercados para os industriais mais nocivos desse país, reunidos no agronegócio, e estamos chamando isso de transição energética. Isso cheira tão mal quanto os agrotóxicos e o trabalho escravo nas lavouras de cana.
As insistentes parcerias militam a favor da financeirização da Petrobras com consequências graves para a qualidade do emprego, o enfraquecimento dos sindicatos e o custeio da PETROS.
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