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Um Congresso servil ao Capital

No Brasil, o futuro não se perde apenas em golpes espetaculares. Ele se dissolve em emendas, chantagens e votações discretas, conduzidas por mãos que há tempos já nem disfarçam não representar os interesses populares.

O Congresso brasileiro, hoje dominado por centrão e extrema-direita, obviamente, não atua em nome do interesse público. Sua maioria opera em bloco para sabotar direitos sociais, proteger os muito ricos e abrir caminho para a privatização da saúde e da educação. A chantagem não é contra um governo, mas contra a população.

Brasília (DF), 25/06/2025 - O Presidente da Câmara dos deputados, Hugo Motta. <br> (Foto: Lula Marques/Agência Brasil)
Brasília (DF), 25/06/2025 – O Presidente da Câmara dos deputados, Hugo Motta.
(Foto: Lula Marques/Agência Brasil)

A crítica necessária não é contra o Congresso enquanto instituição da democracia, mas contra sua composição atual, que transformou o parlamento em trincheira do grande capital. Não é o caso de negar a legitimidade do voto popular, mas de denunciar como os mecanismos de poder e financiamento capturaram a representação, colocando a casa legislativa a serviço de interesses privados.

Esses grupos não chegam a Brasília para discutir políticas de fortalecimento de direitos. Chegam para blindar o capital – sobretudo o especulativo, que nada produz, mas lucra com a concentração de riqueza e com a desregulação do Estado. Não estão preocupados com profissionais que recebem salários altos, mas com a elite financeira que dita a política tributária e molda o orçamento de acordo com seus privilégios.

É nesse movimento que se instala a chantagem: ao barrar medidas como a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda até R$ 7.500, a maioria parlamentar não apenas confronta o Executivo; atinge diretamente milhões de trabalhadores que sobrevivem com dois mil reais ou menos. A escolha é consciente: poupar os de cima e penalizar a maioria, transferindo recursos públicos para quem já concentra renda.

Essa engrenagem se repete em cada corte orçamentário. Retira-se dinheiro da educação, da saúde e da assistência não por descuido, mas como parte de um cálculo político. O objetivo é esvaziar a capacidade do Estado de garantir serviços públicos de qualidade. Ao degradar escolas e hospitais, prepara-se o terreno para o discurso da inevitabilidade da privatização. A lógica é conhecida: primeiro sabota, depois vende a solução no mercado.

Arthur Lira e o centrão são peças centrais nesse processo – Motta é pau mandado –, suas emendas e articulações não são apenas jogadas fisiológicas e dinheristas; são instrumentos de captura. A extrema-direita fornece a justificativa ideológica, falando em “eficiência” e “Estado mínimo”, enquanto o centrão negocia cada passo como mercadoria. Diferentes estilos, mesma função: sustentar o capital.

O resultado é evidente. Em vez de consolidar os direitos sociais previstos na Constituição de 1988, o Congresso atual trabalha para enterrá-los. O féretro da Constituição Federal de 1988 é o sonho e o objetivo dessa gente. A Carta nunca foi plenamente aceita pelas elites brasileiras porque estabeleceu mínimos civilizatórios: saúde universal, educação pública, seguridade social. Enquanto essa Constituição resistir, o projeto neoliberal de privatização total não se concretiza.

A disputa não se limita a arranjos de plenário. É uma luta de classes travada em torno do orçamento público, em que cada corte é uma escolha política e cada emenda é um recado sobre quem merece viver com dignidade e quem pode ser descartado.

A resposta precisa ser firme e pública. Não basta indignação silenciosa. É preciso ocupar as ruas, expor a engrenagem de interesses que sustentam essa maioria e esvaziar politicamente os que se vendem ao capital. Defender a Constituição de 1988 é hoje defender o próprio direito à vida coletiva.

Quem deseja enterrar a Carta revela o país que projeta: um Brasil privatizado, desigual,  excludente e dependente. Cabe à mobilização social e à ação política impedir esse desfecho e afirmar um futuro de direitos. Resistir não basta; é necessário derrotar o projeto neoliberal em sua raiz, para que saúde e educação permaneçam como bens públicos e não como mercadorias no balcão do capital.

(*) Ricardo Queiroz Pinheiro é bibliotecário, pesquisador e doutorando em Ciências Humanas e Sociais.

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